Câncer supera doenças cardíacas e lidera mortes no Brasil

Redação GBOT

24 de fevereiro de 2025

08:00

Câncer supera doenças cardíacas e lidera mortes no Brasil
By Freepik

Nos últimos anos, o Brasil tem testemunhado uma mudança importante no perfil de mortalidade da população. Tradicionalmente, as doenças cardiovasculares eram responsáveis pelo maior número de óbitos no país. No entanto, pesquisas recentes indicam que o câncer se tornou a principal causa de morte no Brasil, ultrapassando o recorde de mortes provenientes de doenças cardíacas em diversas cidades brasileiras, o que revela uma transição epidemiológica que reflete tanto mudanças demográficas quanto novos desafios de saúde pública.

Câncer é a principal causa de morte em muitas cidades brasileiras

Uma pesquisa conduzida por instituições renomadas, incluindo a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e publicada na revista científica The Lancet Regional Health – Americas, apontou que em 2000, apenas 366 municípios brasileiros registravam o câncer como a principal causa de morte. Nesse contexto, em 2019, esse número quase dobrou, chegando a 727  municípios, o que representa 13% neste referido ano, um aumento de quase 100%. Essa tendência de aumento é ainda mais evidente em áreas economicamente desenvolvidas, onde as mortes por doenças cardiovasculares têm caído significativamente. O estudo também analisou dados de 5.570 municípios entre 2000 e 2019 revelou uma queda de 29% nas mortes por doenças cardiovasculares, enquanto os óbitos por câncer aumentaram 9% no mesmo período.

A redução das mortes por doenças cardiovasculares foi observada em 25 dos 27 estados brasileiros. Em contraste, a taxa de mortalidade por câncer cresceu em 15 estados, tornando-se a principal causa de morte em mais de 700 municípios, com destaque para Paraíba, Tocantins, Piauí e Maranhão. O percentual de cidades onde o câncer passou a ser a principal causa de morte aumentou de 7% para 13% ao longo das duas décadas analisadas.

Leia mais OMS: Casos de câncer podem aumentar 70% em países como o Brasil até 2045. 

Dessa forma, o principal fator por trás dessa mudança é o envelhecimento da população. Com mais pessoas vivendo por mais tempo, aumenta a probabilidade de desenvolverem câncer, uma doença que está diretamente relacionada ao avanço da idade. Além disso, o estilo de vida moderno, caracterizado por sedentarismo, alimentação inadequada, consumo de álcool e tabagismo, tem elevado a exposição a fatores de risco que contribuem tanto para doenças cardiovasculares quanto para diferentes tipos de câncer.

Por que as doenças cardiovasculares estão perdendo espaço?

A redução nas mortes por doenças cardiovasculares é um reflexo direto de avanços em prevenção e tratamento. Políticas públicas de controle de hipertensão e diabetes, bem como melhorias no acesso a tratamentos, têm desempenhado um papel fundamental nesse processo. De acordo com o professor Leandro Rezende, da EPM/Unifesp, “o melhor acesso a tratamentos e ações de prevenção primária explica a queda nas mortes por doenças cardiovasculares nos últimos anos”.

Por outro lado, tratar o câncer envolve desafios mais complexos e custosos para o sistema de saúde. A necessidade de diagnóstico precoce, tratamentos avançados e, muitas vezes, de longos períodos de acompanhamento dificulta a obtenção de resultados tão expressivos quanto os alcançados na luta contra doenças do coração.

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Desigualdades regionais e impactos no Sistema de Saúde

Outro aspecto importante destacado pelo estudo é a desigualdade regional. Nas regiões mais desenvolvidas, como o Sudeste, a transição epidemiológica está mais avançada devido a melhores condições de acesso à saúde e maior renda per capita. Já nas regiões com menos recursos, o câncer continua crescendo, enquanto a redução nas mortes por doenças cardiovasculares é mais lenta.

Essas disparidades refletem não apenas diferenças no acesso a tratamentos, mas também na efetividade de campanhas de prevenção. Regiões com menos recursos enfrentam dificuldades em implementar ações que possam conter a incidência e mortalidade por câncer de forma eficaz.

Câncer e a responsabilidade das políticas públicas

As políticas públicas são responsáveis mundialmente pelas iniciativas de controle do tabagismo, que começaram na década de 1980. O aumento de impostos sobre cigarros, restrições à publicidade e proibição do fumo em locais fechados contribuíram para uma redução significativa no número de fumantes, de cerca de 25% para 10% da população.

No entanto, os efeitos dessas medidas sobre o câncer só serão plenamente percebidos nas próximas décadas, devido ao longo período de latência da doença. Isso reforça a necessidade de ações preventivas de longo prazo e de uma estratégia robusta para diagnóstico precoce e tratamento adequado.

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A transição epidemiológica no Brasil reflete uma tendência já observada em países de alta renda. Especialistas acreditam que, nos próximos anos, o câncer se tornará a principal causa de morte em todo o território nacional. Para enfrentar esse desafio, será necessário investir em políticas públicas que incluam:

Campanhas de Prevenção

Ampliar ações de conscientização sobre os fatores de risco associados ao câncer e incentivar mudanças nos hábitos de vida da população.

Diagnóstico Precoce

Melhorar o acesso a exames preventivos e tecnologias de rastreamento em todo o país.

Tratamento Acessível e Eficiente

Garantir que os pacientes tenham acesso a terapias de qualidade, independentemente de sua localização ou condição socioeconômica.

Redução das Desigualdades Regionais

Desenvolver estratégias específicas para regiões menos favorecidas, fortalecendo a infraestrutura de saúde e ampliando o alcance das ações preventivas.

Veja tambémQuase metade das mortes por câncer é prevenível

O câncer está emergindo como um dos maiores desafios de saúde pública no Brasil. Esse fenômeno, impulsionado pelo envelhecimento populacional e pelas desigualdades regionais, exige uma resposta imediata e coordenada. Com políticas públicas bem planejadas e um sistema de saúde fortalecido, é possível não apenas reduzir as taxas de mortalidade, mas também melhorar a qualidade de vida dos pacientes e suas famílias.

Em suma, a transição epidemiológica é um reflexo de como a sociedade e os desafios de saúde estão em constante evolução. Por isso, enfrentar essa nova realidade exige uma abordagem integrada, que combine prevenção, diagnóstico precoce, tratamento acessível e políticas de redução de desigualdades. Somente assim o Brasil poderá lidar com essa mudança de forma eficaz e sustentável.

Fonte: com informações de reportagem publicada na revista Veja | 14 de outubro de 2024.

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